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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto e biografia: www.historiadealagoas.com.br/

 

 

VIRGÍLIO GUEDES CORREIA LIMA

 

Virgílio Guedes Correia Lima nasceu em Maceió no dia 2 de janeiro de 1884. Era filho de Josephino Guedes Correia Lima e Aristéia Maria dos Prazeres Guedes Correia Lima. A pesquisa localizou uma irmã: Maria Guedes.Fez seus estudos preparatórios no Colégio 15 de Março e as provas no Lyceu Alagoano nos anos de 1895, 1896 e 1897.
Muito jovem, começou a trabalhar como telegrafista de 4ª classe na Repartição Geral dos Telégrafos. Esteve lotado ainda no Rio Grande do Sul (Pelotas, Bagé, Santana do Livramento), em São Luiz do Maranhão, no Rio de Janeiro e em Maceió a partir de 1910, quando foi promovido a telegrafista de 3ª classe.
Em novembro de 1899, era o redator d’O Madrigal, órgão da Sociedade Literária Tavares Bastos em Maceió.
Somente em 1906 iniciou os estudos para o bacharelado pela Faculdade Direito do Rio de Janeiro.
Em 1909, no período de férias da Faculdade, dava aulas no período noturno para a União Operária. Ensinava Português, Aritmética e Geometria.
Transferiu o curso de Direito para a Faculdade do Recife em 1910, onde concluiu seus estudos no final daquele ano. Neste mesmo ano foi nomeado Diretor da Escola Racional da União Operária em Maceió.
Em janeiro de 1911, foi promovido a telegrafista de 3ª classe do Telégrafo Nacional. No mês seguinte estava lotado em Maceió.
Foi um dos fundadores da Associação Alagoana de Advogados em 1917, sendo eleito tesoureiro da agremiação. Neste mesmo ano foram formados em Maceió os Centros Cívicos em apoio à candidatura de Gabino Besouro. Virgílio Guedes foi um dos articuladores do núcleo da Levada.
Membro fundador da Academia Alagoana de Letras, em 1919, ocupando a cadeira nº 14, de Joaquim Cavalcanti.
Em 1921 fundou a revista pedagógica “A Educação”, em Maceió. Neste mesmo período era o Secretário de Representações da Liga dos Republicanos Combatentes, instituição dirigida por Manoel Luiz da Paz e com sede na Rua Dr. Miguel Omena, 69, na Levada.
Em 1929 era o presidente da Sociedade Protetora dos Animais.
Foi diretor, em 1931, da Faculdade Livre de Direito de Alagoas e professor catedrático em Economia Política e interino de Ciência das Finanças da Faculdade de Direito de Alagoas, também professor da Escola Superior de Comércio de Alagoas.
Utilizando o pseudônimo de Gesualdo de Oliveira, em 1913, publicou o panfleto “Quem Foi Rei”. Também usou os pseudônimos Juan de las Lhanas e J. de las Lhanas.
É autor de “A Festa dos Martírios”, livro de poesias publicado em 1981 e “A Árvore”.
Sempre residiu no bairro da Levada. Faleceu na Rua Formosa, 832 (á época ainda denominada Av. Gabino Besouro) em 18 de janeiro de 1940.
Em sua homenagem, a antiga Rua dos Timbiras, na Ponta Grossa, passou a ser denominada Rua Virgílio Guedes por determinação da Lei Municipal nº 333 de 3 de dezembro de 1953.

 

 

AVELAR, Romeu de.  Coletânea de poetas alagoanos.  Rio de Janeiro: Edições Minerva, 1959.  286 p.  ilus.  15,5x23 cm.  Exemplar encadernado.  Bibl. Antonio Miranda

 

 

        FESTA DOS MARTÍRIOS

Em Maceió...
Naquele tempo, a praça era chamada Largo dos Martírios
Porque ali se levanta o templo majestoso
até agora,
o Santo Milagroso.
Não havia a estátua de Marechal Floriano,
mas havia o Cruzeiro que está lá no alto,
pois assim, bem o quis um Sr. Intendente
contra o gosto, talvez, do Bom Jesus.

A Festa dos Martírios eram muito animadas!
Era uma festa de arromba!
Muito foguete, muita bomba,
A pirotécnica de Alagoas, de Maceió e do Pilar!...
Do Murici e de União, de Viçosa e de Atalaia,
de quase todos os municípios deste Estado...
Vinham muitas pessoas à festa tradicional
da Capital!

Ai daqueles cujas safras não davam para gastar!
Ficavam nos engenhos vendo o trabalho rudo,
ouvindo o canto das cigarras,
o gemer das almanjarras...
Era raro, porque naquele tempo dava o dinheiro para tudo;
mesmo depois do cativeiro, ainda havia negro forro
acostumado no campo a trabalhar...

Ah! que tempo feliz! Que tempo bom!
A “Minerva” brigava com os “Artistas”,
famigeradas bandas musicais!...
O professor Valério!... — Lá estão seus ossos esquecidos
bem ao pé da calçada do velho Cemitério!...
O Benedito Piston — o maestro Benedito,
cujo nome será inesquecido enquanto Alagoas escutar
o hino do Estado tão bonitos que ele compôs...

O velho Marcolino (lembram-se vocês?) errando no clarinete...
O Severino tocando bombardino... O povaréu junto ao coreto.
Palmas, vivas, bravos, cada vez
que terminava um dobrado ou cavatina...
Um delírio musical! A multidão desatina...
E de um lado e d´outro lado: — Fora! Morra!
Apitos, assobios!...
—A música dos “Artistas” não se afasta!
—Não é possível que a “Minerva” corra!
Uma finda, outra começa,
cada qual capricha mais em tocar coisa mais linda
por toda a noite a fio, sem haver repetições...
Música até de manhã num pavoroso e delirante
desafio!...

 

        Mas não fica nisso só!
Vem Benedito de Castro, Mané Coqueiro Sem Nó.
E depois? Pauladas, tiros, facadas,
correrias, bofetadas,
gritos, apitos e prisões...
não obstante a serena intervenção
do ilustre doutor chefe de Polícia
Francisco de Paula Leita e Oiticica,
naquela ocasião.

Houve um que pretendeu furar o bombo dos “Artistas”,    
um tresloucado rapaz; mas Manoel Boaventura não deixou
e por isso levou
cacetadas a valer...
O Boaventura ficou doente até morrer,
sofrendo do pulmão...

À noite, as pretas sentadas em frente aos seus tabuleiros
vendiam broas, roletes, amendoins, queijadas,
cocadas, manuês e alfinins, à fumaça de gás dos candeeiros...
E elas, sacudindo um maço de papel
ou galho de pinhão, que livra dos maus olhos,
defendiam a cabeça para que não a furassem
as flechas dos foguetes que baixassem...
Eram rojões em tropel!

Não havia no pátio, como agora,
aquelas mangueiras e oitizeiros, nem o palácio do Governador,
nem aquele palacete da Intendência
que vem do Demócrito Intendente...
Demócrito! como era belo, eloquente
teu verbo encantador!
E por isso, (Oh! o tempo não passa!...)
era enfeitada a praça de pés de uricuris,
em cujas palmas eram presas e acesas
as lanternas multicores, os balõezinhos,
os galhardetes de papel de cor (tentações dos guris).
Os meninos gritando, chorando, emperrando,
causando tormento aos pais, pedindo doces e vintém.
—Eu quero andar nos cavalinhos!...

— Seu Petronilho! Seu Petronilho!
E os cavalinhos rodando... unhem, unhem, unhem...
a rodar, a rodar, a rodar...
rangindo, ringindo... O realejo a tocar...
Inhom... Inhom... Inhom...
uns trechos do Barbieri de Seviglia...
O Cosmorama do Pedro Vendaval!...
—Olha os cosmoramas! Venham ver Belzebu
o diabo coxo — o maioral...
Venham ver os anjos da Côrte celestial.
Vê-se a França, vê-se Roma, o reino de Portugal!
Também se vê o Japão! Vão entrando, vão entrando!
cada pessoa um tostão.
— Corre a changa!

Que doce simplicidade daquela gente de outrora!
E agora
Como nos apraz viver a recordar essas meigas velharias!
Um caixãozinho de quinquilharias!...
—Compra um bilhete, papai.
—Pra que? se nada sai!
E dentro de um milhão de bilhetinhos brancos
um premiado aparecia, com um grampo ou um botão,
ou um novelo de linha, como aqueles com que fazia
renda Minharinha!...
A casa inglesa inda gira,
arrancando os laços e tirando as tiras!
Esta é boa, esta espirra! Olha a gengibirra!
É boa de gosto!”

 

        O Antonio Assinalado... O Prudêncio e o Sabinol...
O Saturnino...
O Antônio Coió, a velha Sinhá Rosa do Laurindo...
Iam abrindo a gengibirra que espoucava
como as bombas dos fogueteiros,
do seu Agostinho fogueteiro,
O pai do Chico, tão pretinho... que sabia “tentear”
o chapeuzinho para se tornar mais elegante!...
Olha, este aqui é sem iguá!
E cerveja de cordão!
—“Copos lavados em água Rubiná!”
Era o fanhoso pregão daquele vendedor
que morava em Bebedouro, no alo do Urubu...
A rolha pulava longe. Pu!... A gengibirra espumava...

 

        O Zé Veneno calou-se...
—Já terminou o leilão.
Aquele traz um capão cheio de laços de fita!
Aquela um prato de doces... menos doce que o amor
do namorado que o deu...
—Lá vão tocar fogo nas rodas! Todo o povo se alvorota...
Começa a roda a rodar! Xá...  Xá...  Xá...  Xá...
Xi... Xi... Xi... Tá...  Taratá... Tá.

— Bota sebo na mão, porcalhão!
Pou... Piu...
Olha o balão!  Fiu...ú... ú...  — Olha o papagaio!
Quando prendiam o fogo no painel
e o Bom Jesus na tela aparecia, os homens se descobriam,
as mulheres se benziam, os sinos repicavam.
as músicas tocavam...
E foguetes sem conta para o ar!...                                        A fé sempre bendita a todos comovia...

E a praça ficava cheia de fumaça...
E o fogueteio calado, encabulado,
a catucar uma roda que falhou,
E a roda não anda nem desanda.
—Piu! Chou!...
Vinha depois o boneco de fogo
que dança e tirava o chapéu
e, por fim, se incendiava!...
—Mamãe, não vamos agora,
para que tanto vexame?
Olha, inda vão acender
o navio que corre no arame...

—“Olha, Lulu, a ponta de Alcebina!
Já não parece mais a libertina
do Pastoral do Dão...
O Lamego, o Chico Teles, o Messias...
Eles podem gastar, ela pode luxar!”
O tango da moda é este:
“Eu tenho, mamãe, eu tenho
Saudades que não tem fim
Do tempo em que eu era pobre
Que não me vestia assim!”

Percebeste?
—As filhas da Artemísia já se foram
com as sapecas da rua do Reguinho...
Se formados depois, os estudantes
se lembram mais daquelas pobrezinhas!...
Nem os caixeiros quando forem sócios,
homens de negócios... Coitadas!
É por isso que são pobres tão faladas!...

—Lá vem o Pedro Colombo distribuindo o “Clarim”!
—Olha o que traz: “que o Silva da “Nova Aurora”
é sempre visto na rua do Hospital;
...que um alferes de polícia caiu numa cacimba
no fundo de um quintal!...
Olha o Braz...”

Como um palito fardado, ou grande ponto de admiração,
transita o Prisco apressado! —Que telegrama será?
—“Eu sou cigarreiro honrado de fábrica do Lopes Sáa!”

 

        A multidão enorme se acotovela, estua...
A riqueza, a pobreza, os pobres tipos de rua...
Pobre cego, coitadinho!

        O guia lhe vai ditando a quem deve cantar...
A violinha tocando, a prima quase chorando,
o bordão a suspirar:

        “Oh, moço que vai passando,
de paletó engomado,
com seu chapéu de palinha,
deste mal afortunado!”

E mais outro, do outro lado:
“Meu irmão, dê-me uma esmola
que seja mesmo um vintém...
Neste mundo tem um prêmio
e no outro recebe cem.”

O terceiro infeliz de voz mais dolorosa:
“Quando Deus andou no mundo
A São Pedro disse assim:
Quem não quer pobre na porta
também não me quer a mim!...”

O Maneco, coitado, pobre flor da demência...
“Amanhã tem missa... Quem varre a igreja é a beata.
Rato com coco,
lagartixa com feijão,
o ferreiro fez a foice
Mas não fez o gavião!
Olha a Babá! Eu sonhei com borboleta
Que bicho dá?

O negrinho Olô, cantando, rodando,
dançando, fazendo piruetas...
—Olô, viva Deus! Olô...é com seus poderes...
Alô da soletração...
E da pimenta malagueta...Olô...

Na porta de um botequim, o Elias Bacalhauzada,
sob os vapores de Baco, declamando assim:?
—“O amor da mulher é castanha
cozinhada em panela de barro,
é manteiga francesa, rançosa,
que na güela nos deixa o pigarro!”

 

        O Loula Pensamento também vinha tocando flauta,
e, logo se detinha
para pedir um “pensamento de farinha” ...
Afinal, o Lúcio Soteriano, veterano
da Guerra do Paraguai, gritando a largos pulmões:
“No Brasil não há soldados para prender os ladrões!
Eu sou liberal!”
Numa voz muito fina
Um moleque cantando lá na esquina
da casa do Zé Gomes Silva Lins:

        “Iaiá, tem café coado?
dê-me uma xicrinha
pro seu delegado...
Eu tenho, mas porém, não dou
que o café bom... é pro seu dotô...”

4 horas da tarde de domingo!
Lá vem chegando as gentes da Levada,
do Bebedouro, do Mutange, do Poço e do Farol.
Quantas saias engomada, frisadas!
As africanas da rua do Reguinho e da Santa Maria,
de colares vistosos e cabeções tão brancos,
cortando línguas: —Okualê ohualá, oucou slanhkkan
Egogêmetá...

Da cruz alçada vêm chorando as Irmandades!
As respectivas entidades do Rosário:
O Moreno Carteiro do “Trocista”, o mestre Féliz,
o magro Olímpio Raposo que vendia livros velhos...
Justo Mesquita, ensaiador de Pastoril,
Mestre Ivo sapateiro, claudicando duma perna...
Outros irmão, outros mais...
E todas as confrarias vêm chegando:
São Benedito, Livramento, O Santíssimo Sacramento!
Quincas Pereira, Firmo Lopes, João da Cruz...
O Chico Pontes de Miranda...

Muitos outros irmãos do Bom Jesus...
O velho Passos marceneiro que alugava
mesas, cadeiras, camas e sofá às mulheres do Maraba.
Antonio Pinto. O Teodósio que foi rico...
O major Simeão da Jacutinga.
Braz Próspero Jerová da Silva Coroatá.
A Guarde de Honra da Força Policial!
O padre Lessa que foi meu professor...
O padre Rocha que tocava violão.
O padre Otávio que foi grande pregador...

O sino sempre a tocar: Dilin, dilin, dilão!
Lá vem saindo agora a procissão!
Sereno, no seu andor, o Bom Jesus dos Martírios
miraculosos e glorioso, numa expressão divina de bondade,
luz vai deixar e amor pela cidade!
Meu bom Jesus, tirai-me a dor que me crucia!
—De todo mal, meu Bom Jesus, livrai-me!
—Dai-me luz aos meus olhos! Protegei os meus filhos,
que eles estudem, sejam homens!...
E o Bom Jesus, tão grande e tão perfeito
Manda consolo e paz a cada peito!

Ah! minha boa mãe, quanto te adoro!
Não sei por que, lembrando estas coisas, não choro!
Esse tempo se foi... esse tempo sumiu-se...
Dele resta a mais grata lembrança,
a suavidade, a doce amenidade
do meu tempo feliz de adolescente!
Ah! como recordar maltrata a alma da gente!...
Joca Moreira, hoje pintor,
naquele tempo já risca figuras no papel
e o sete, na praça, toda noite,
esperando pela bolandeira e pelo painel que o Caldas fez
e por aquela da rua 16.
Indiferentes às coisas más da vida
nos dias festivais da mocidade,
o Cipriano, o Júlio,, o Luiz Franco, o Joca
Virgílio, João Medeiros, Januário!...
—Tânia, que notícias me dás do teu poeta?
Santa, como tudo é falaz no vértice da vida!...
Julieta, lá foi levada pela morte!...
E aquela voz suave, cristalina de Enedina?
Tudo foi de roldão na dobadoura do tempo!
Quem é que põe um dique à lei dura da sorte?

Josué fez parar o sol,
consoante o dizer das Santas tradições...
Os mortos podem muito!
Manda, Josué, voltar a nossa idade
com seu cortejo azul de tantas ilusões.
Lá está vivendo em São Miguel dos Campos,
quase velho, o padre Júlio de Albuquerque,
dizendo missas, batalhando
pela fé cristã, almas arrastando
para o divino aprisco do Senhor...
Com o máximo fervor.
Lendo o breviário, o missal, toda manhã,
e burilando as prosas magistrais
como aquelas que enfeixou naquele tomo d´Alma das
Catedrais”.
Ele foi feliz, que se fez padre, está sossegado e só
naquela cidadezinha, na paz abacial de São Miguel dos Campos
de Nossa Senhora do Ó...
Lendo, estudando, fazendo o culto da Santa Virgem,
o culto das belas letras, oficiando:
Pax tecum!...
Introibo ad altare dei
Dominus tecum.!
...

Ah! como tudo mudou! O mesmo tempo abriu a porta dágua
e a roda dos anos correu que se danou...
Não somente a mulher, como diz a cantiga:
(la dona é mobile).
Tudo na terra é móvel,
mas é sempre melhor o tem que se foi!...
Adeus, carro de boi!
Fonfonando lá vem louco automóvel!
Ontem, a Maria caiu nos mangues da Levada,
amarrada ao balão!
“— Sou Ferramenta,
Você sobe ou arrebenta?
Hoje, asas abertas passa um avião...
Tudo no mundo agora é diferente!
Desse tempo que foi, resta apenas a lembrança...
E Maceió acabou-se no ruge-ruge da Civilização,
onde há mais interesse e menos coração!
Já não canta, já não dança
o côco legendário e popular:
O meu barco é veleiro
Nas ondas do mar...”

 

        Pisei, pisei na ponta da rama,
pisei, pisei na rama colar,

        pisei, pisei teu lindo pezinho,
tornei a pisar no teu calcanhar”.
As umbigadas, os volteios, os meneios,
os quadris em bamboleios,
as bonitas emboladas à cadência do ganzá...
— “Você diz que tem amor,
por que não diz a quem tem?
o mais certo é que você
não tem amor a ninguém”.
— “A ciranda, a cirandinha?
Vamos todos cirandar”...

        E nesta quadra incerta,
já não se faz serenata à luz do plenilúnio.
Há muitos emudeceu a voz do violão
Que chorava e gemia pela rua deserta...
Quando a tradição desaparece
resta apenas, para quem sabe sentir a recordar,
a doce claridade, a suavidade
deste luar que é a saudade!

        Januário de Carvalho, meu saudoso colega,
Meu velho e bom amigo, rezemos
por alma de nosso tempo de rapaz!
Hoje, apenas temos
esta luta infernal que a vida traz!
Os filhos... a mulher... —esta porção de cuidados!...
Eu tanto já pensei no meu futuro,
que já não penso mais.
Belos tempos, inesquecíveis tempos romanescos,
pitorescos...
Bem como as águas da fonte
foram correndo... correndo... e não voltaram jamais!
Para que lembrei tantas coisas perdidas,
tão simples, de encantar?
Acordei o passado que dormia...
Todo o esplendor que teve já não vê!

        Que doloroso e triste despertar!
Henri de Regnier, vem ensinar
que eu não posso fazer a “dor sorrir
nem a beleza chorar...”       

 

*

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Página publicada em junho de 2021


 

 

 
 
 
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